Há
mais de 20 anos, estive em Ouro Preto em uma última viagem antes de me
casar. Este ano, resolvemos que passaríamos por lá o Réveillon.
Engraçado
como nosso olhar sobre as mesmas coisas muda, drasticamente. Não era a mesma
cidade de 20 anos atrás.
Olhei
tudo com profunda tristeza pelo descaso com as construções. Imensas trincas,
descascados e ‘entalhes’ de nomes dos visitantes por fora das estruturas. Por dentro, mais
trincas, mofo e outras deteriorações que me causaram imensa frustração.
Penso
que, no Brasil, a memória de um povo pouco, ou quase nada vale.
Ouro Preto - sob a Ponte dos Contos |
Conhecemos
o Tó, um Guia local logo ao segundo dia. Com ele, as preciosas informações
sobre os chavões, que repetimos à exaustão, mas, como nenhum livro ensina, desconhecíamos
seu significado.
“Onde
o filho chora e a mãe não vê” – Os negros escravos crianças, adentravam as
minas de ouro em espaços que mal cabiam seus corpos e, ali, sofriam toda sorte
de temores e flagelos. As mães, ficavam longe. Nas senzalas, ou só deus sabe
onde e não viam ou ouviam seus lamentos.
“Pé
de moleque”. Na verdade, “pede, moleque”, quando os doces eram colocados às
portas das casas para secar e eram ‘furtados’ pelas crianças, as donas gritavam
para que eles pedissem e não roubassem.
“Feito
nas cochas”, para as telhas de barro moldadas nas pernas para terem o formato
abaulado.
“O
Quinto dos Infernos”, quando 1/5 do ouro garimpado ia para a Coroa Portuguesa.
Fiquei
arrasada e não consegui terminar o passeio na Mina. É muito sofrimento e
angústia. Já fora, recobrando um pouco os sentidos, soube do Guia que Chico
Xavier nunca conseguiu conhecer Ouro Preto, tamanho sofrimento que paira sobre
a cidade.
Na
fachada da Prefeitura, uma faixa avisa que o Governo de Minas Gerais deve ao
Município mais de R$ 30 milhões.
De Mariana, vemos os pés do morro onde ocorreu o maior desastre ambiental |
Mariana
com as ruas vazias foi outra grande tristeza. O guia local me informou que os
turistas acham que a cidade está sob a lama, o que não é verdade. Aponta onde
ocorreu o desastre, de cima do mirante e com profunda tristeza mostra as
construções irregulares no meio do morro, que rapidamente foram abandonadas por
não estarem seguras em um local que já fora explorado com dinamite. Informa que
as famílias correram para a cidade em busca de abrigo e conclui que a maioria
morrerá sem receber a indenização pelo desastre causado pela Samarco/ Vale.
Congonhas do Campo |
Congonhas
do Campo, mais uma vez, a decepção. Os ignorantes de plantão fazem questão de ‘esculpir’
seus nomes e cidades de origem nas preciosas imagens dos profetas, quando os
moradores insistem em proibir que o IFAN as proteja com vidros. (explicação da
Victoria).
Juro
que fiquei arrasada. Sim, porque conhecia. Sim, porque já havia visto o descaso
há 20 anos, mas agora, parece que além de agravado, me condoeu mais.
Minha
estudante de Arquitetura e Urbanismo amou. O pequeno nem tanto.
Em
mim, mais numa vez, ficou aquela sensação de culpa pela mácula que a escravidão
deixará para sempre na nossa história.
Ali os anjos testemunham os novos
visitantes, e fazem um apelo mudo para que tenhamos consciência. Consciência
sobre a segregação, o preconceito e a história que se não for preservada, será
esquecida, ou pior, repetida.
Ouro Preto |
Tó. O melhor Guia local. |
A Mina |