segunda-feira, 30 de junho de 2008

A mala

Acordamos cedo no sábado, mesmo sabendo que o Denis teria reunião em Jaguariúna, e que seguiríamos para São Paulo somente à tarde.
Vivi, ansiosa, dava os últimos retoques em suas malas e sacolas. Eu resolvi ver o que tanto ela havia colocado na mala.
Tirei a "bigorna" do chão com muita dificuldade, colocando-a em cima da cama no quarto dela.
Pude sentir o estrado gemer...
Abri a dita cuja e, nossa!!! as roupas pularam ejetadas, de encontro ao espaço que teriam fora da mala...
Vasculhei meio por cima, pois se eu tirasse tudo, demoraria umas 4h para refazê-la.
Impressionou-me a quantidade de pijamas e camisolas disponíveis no artefato:
contei, um dois, três, ali socadinho do lado, quatro, cinco, peraí, puxei um pedaço de calça azul, seis...nossa, tinha camisolas também...umas quatro ou cinco.
Arranquei tudo e decidi rever, pelo menos, este item.
Pijamas das mais variadas cores, modelos, estampas, padronagens...um desfile para a noite do pijama...para a noite da camisola, as opções também eram muitas.
Um frio desses e minha pequena coloca as lindas camisolas de alcinha bordadas e com rendas...
Meu Deus!!!!
A mala, refeita (apenas neste item, deixo claro), fechou um pouquinho mais fácil, mas ainda assim o ziper estava emperrando...abri a dita de novo.
Toda, eu disse TODA a coleção de biquínis enroscavam-se nas blusas de lã, cacharréis, cachecóis, calças jeans, de moleton, de sarja, de veludo...
Imaginei que ela não esta indo para a praia e sim, para a semana de moda em Paris...
Ou então, que preparava um extreme make over em seu guarda-roupa ou iria participar daquele
programa: esquadrão da moda...
Os biquinis deixei na mala...vai que um não servia, o outro não combinaria com a canga...ela iria me matar, ou pelo menos pensar muito mal de mim.
Olhei o "baiacú" e decidi, finalmente e definitivamente fechá-lo, não sem antes colocar umas quatro jaquetas...criança, sabe como é, nunca se preocupa com isso e mãe, é mãe...
Quando desci a bigorna de novo, ela me entrega umas quatro bolsas extra contendo em uma, apetrechos de toilet, em outra, calçados...mais a bolsa de mão com o celular, baton, dinheiro, etc, etc, etc...
Descemos para a garagem para acomodar a bagagem no carro, correndo o risco de sobrecarregar o elevador...empurra, soca, ajeita, vira, torce, coube tudo...ufa!
Abrimos a porta da garagem e ouço um:" ai, eu não acredito..." seguido de um choro sofrido e desesperador.
Victoria havia esquecido o carregador de celular, um perfume, o io-iô e outras cositas...
Engatei segunda marcha e seguimos para São Paulo, sem pensar em voltar para pegar mais nada.
Vai que ela inventava de fazer outra mala...

sexta-feira, 27 de junho de 2008

Eu fico aqui...

Eu fico aqui.
Arrumando sua mala,
Esperando você partir
Um mês de férias na casa do vovô
o quarto fechado
O silêncio da TV
O banheiro arrumado...

Eu fico aqui.
As horas não passam
A ausência corroe a alma
O sentimento, de morte
De ausência

Eu fico aqui
Ouvindo você dizer
"Ai mãe, é só um mês"
Um mês tem 30 dias
720 horas
43200 minutos
2.592.000 segundos
intermináveis

Eu fico aqui,
esperando o momento em que paro
De ouvir sua voz
De te chamar a atenção
De dar um beijo,
Um abraço
Um apertão

Férias são para mim tortura
Ausenta quem tanto amo
Fico amputada e muda
Jogada no canto da solidão

Voa minha fada
Você não veio ao mundo
Para ficar amarrada comigo
Você é do mundo e a ele pertence
Eu?
Eu fico aqui
Esperando teu regresso
Contando as horas no soroban
Feito com clips de papel

Já estou com muitas saudades
Mamãe
Que vai ficar aqui...

quinta-feira, 19 de junho de 2008

O spilisteixion

Dudu entra no meu escritório, sempre atrás do pai, que acaba de chegar em casa, exausto, após uma “chegadinha” em Joanópolis.
“pai, vamus jogar spilisteixion?”
“o que Dudu?”
“spilisteixion, vamus”
O Playstation fica guardado com o maior cuidado do mundo. O Dedi ganhou de um colega de trabalho e se recusa a deixar alguém mexer (dedinhos pequenos) em sua ausência.
“peraí Dudu, deixa só eu conversar um pouquinho com a mamãe”
O garoto começa a mexer em tudo no escritório. Corre para cá, pra lá e volta:
“pai, vamus jogar...vamu pai”
“vamos lá. Amor, peraí que eu vou lá com ele...”
Dedi sai do escritório e eu volto à labuta.
Em cinco minutos começa a gritaria, as risadas...
O garoto consegue jogar os carrinhos em uma atividade insana, para mim, que não curto esse tipo de jogo.
“põe o carro amarelo pra mim, pai?”
Particularmente, só gosto que joguem no final de semana, mas, quando o William cisma com uma coisa, sai de perto...
Fecho o escritório e vou para a cozinha preparar o jantar ou algo que o valha.
Os dois, jogando spilisteixion na sala, divertem-se a valer.
Entra minha princesa de seus passeios de bike no parquinho do prédio:
“o que vocês estão fazendo?”
“jogando spilisteixion, ora” responde o pequeno com a cara mais deslavada do planeta.
Em dez minutos, ele cansa, porque seu carrinho amarelo bateu e ele não consegue “desenroscar” do guardrail.
“tó Vi, joga” entrega o controle para a irmã e sai da sala, indo mexer em outra coisa, atrás de mim, na cozinha.

Os sequilhos

Antes de preparar o jantar, dispo-me das últimas atividades de empresária e fecho o escritório pontualmente às 19h30.
A caminho da cozinha, passo pela sala, olho a mochila do pequeno e vejo se tem roupas para lavar, bolachas para jogar fora de tão murchas que ficam, balas para desgrudar, enfim.
Abro a agenda e vejo se comeu, se fez cocô, se dormiu, se deu trabalho...
Dentro da mochila, certa noite, encontrei um pacote com quatro sequilhos, uma fita azul e a receita.
Como o pequeno fica o dia todo no Colégio, à tarde é momento de recreação com as tias.
Eles pintam, brincam, assistem filmes, cozinham (daquele jeito para uma criança de 3 anos, né?).
Olhei o pacote e, claro, não mexi. Levei para a cozinha e ápós o jantar, pedi ao pequeno que contasse para o papai o que havia feito à tarde na recreação:
“ sisquilos” disse ele
“sisquilos? Que legal Dudu”
(Nota de Esclarecimento) : O “Dudu” deve-se ao fato dele, até os três anos incompletos, não conseguir falar seu nome: William. Saía algo como “duínha”. Daí o “Dudu”.
“éééééééé...sisquilos. toma, come!”
O Denis detesta sisquilos, digo sequilhos. Olhou para mim, com aquela cara:
“amor, come, ele está dando para você”
Como bom pai, ele começa a degustar a iguaria sob os olhos atentos e a mais fantástica cara de felicidade do “Dudu”.
“um...que delícia Dudu”
“qué mais? Toma!” disse o pequeno, entregando outro sequilhos para o pai.
A essa altura eu já servia um imenso copo de suco para ajudar o biscoito a descer. A Victoria ria que se matava.
“oferece para a mamãe, ela também gosta, para a Vivi...” disse o pai, desesperado segurando o terceiro biscoito, já com a boca seca, absolutamente sem saliva...
“não, eu fiz pra você!”
Eu comeria até se fosse m...depois dessa. Aquilo foi de uma emoção imensa. Ele guardou para o pai. Queria que apenas ele comesse. Justo ele que é de dividir, dá tudo para mim e para a irmã, por vezes até ficando sem. Ele é um poço de solidariedade.
Em silêncio, o Dedi comeu tudo, quase acabando com a jarra de suco, sorriu para o Dudu e agradeceu, emocionado.

Segue a receita:
Ingredientes
· • ½ xícara (chá) de manteiga
· • 1 ovo
· • 1 pitada de sal
· • 8 colheres (sopa) de açúcar
· • 1 colher (chá) de fermento em pó
· • 2½ xícaras (chá) de polvilho doce

Preparo da Receita

Pre-aqueça o forno à temperatura média (180ºC). Bata na batedeira a manteiga (reserve 1 colher de sopa), o ovo, o açúcar, o sal e o fermento por 3 minutos. Aos poucos, junte o polvilho e amasse com as mãos. Sove por 10 minutos, ou até a massa ficar macia, firme e bem lisa. Modele bolinhas e, com a ajuda de um garfo, pressione a massa formando sulcos. Coloque as bolinhas numa assadeira grande, untada com a manteiga reservada. Leve ao forno por 15 minutos, ou até os sequilhos dourarem. Retire do forno e, assim que amornar, desenforme com cuidado. Sirva os sequilhos com café adoçado com rapadura.

Dica para esta receita

A massa do sequilho deve ser muito bem sovada. Quanto mais for sovada, melhor será o resultado. O sequilho ficará leve e delicado.

Fonte receita: http://www.muitomaisreceitas.com.br

O cabo da panela

Meu marido é amigo há mais de 20 anos.
Sempre moramos na mesma rua em São Paulo com nossos pais.
Os prédios, um na frente do outro, em uma rua movimentadíssima no coração do Paraíso.
Brincávamos juntos desde criança.
Em 1988 nos reencontramos, após longa ausência, em um colégio na Vila Mariana e, estudando juntos, voltamos a ser amigos.
Um dia, por motivos bobos, brigamos e jurei que nunca mais falaria com ele.
Seus pais separaram-se, ele mudou para o Ipiranga e nunca mais nos vimos...por seis longos anos.
Quando o reencontrei, começamos a namorar e nos casamos.
Um dia ele me disse que a felicidade morava nas pequenas coisas. Pequenos gestos que o dia-a-dia e o cotidiano vão roubando de um casal.
Sempre preocupado com os pequenos gestos, para que não se perdessem em nossa rotina.
E lá se vão dez anos de não-rotina.
Noite dessas, ao fazer o tão amado “miojo” do pequeno, notei o cabo da panela bambo e, claro, perigoso.
“nossa Dede, olha o cabo dessa panela como está? Precisa levar à feira para ajustar...”
“é só apertar o parafuso”
“que parafuso?” pergunto eu, procurando o bendito dentro da panela. Loira é uma desgraça.
“por dentro do cabo...”
Olhei o bendito, escondido por dentro do cabo e tentei alcançá-lo, em vão, com a ponta de uma faca para apertá-lo.
Dedi pareceu não dar a menor importância ao caso.
Como bom geminiano, a hora é sempre depois. Nunca na hora, é a hora certa para fazer as coisas, sempre depois, ao melhor estilo Scarlet O´Hara.
Dois dias depois, peguei a mesma panela para preparar o molho e nossa: o cabo estava firme!!!
“amor, vc apertou o cabo?”
“fiquei com medo que se machucasse...”
São as pequenas coisas, os pequenos gestos que fazem com que sinta amor, compreensão e prove em nosso dia-a-dia que ainda nos preocupamos que queremos bem, que cuidamos.
Simples gestos de amor. Nada de ouros, jóias, diamantes, carros. Pequenos gestos que nos mantém alerta, viva e claro, amando cada vez mais.
Parece bobo, mas são esses pequenos gestos diários, que compõe um relacionamento, quem sabe, por mais 10 anos, mais 10, mais 10...

sábado, 14 de junho de 2008

Acordou no meio da noite sonhando que estava em outro lugar.
Perdeu-se por um instante, tentando identificar os objetos do quarto escuro.
Olhou o relógio, 2h30. O lado vazio da cama. O frio lençol esticado como se esperasse alguém. Alguém que não voltaria mais. Nunca mais.
Levantou-se devagar e pensou se deveria fazer isso e perder completamente o sono.
Sabia que se o fizesse sentar-se-ia na sala de estar aguardaria o amanhecer, sem sono, sem chão, sem vida.
Inerte corpo a esperar os primeiros e furtivos raios da manhã para mais um dia.
Calçou os chinelos. Fazia muito frio.
Chegou à sala de estar ouvindo as vozes de um passado remoto. Vozes de amigos, crianças gritando e o som da chave na porta.
Quantas vezes esperou ali sentada pelo momento da chegada dele do trabalho.
Cansado, contando como foi o dia e a praguejar com as vendas mal sucedidas, ou às vezes alegre e radiante com os elogios recebidos.
O silêncio da espera eterna.
Sentou-se delicadamente no sofá, como se temesse acordar os filhos.
Olhou para as fotos na estante. Anos de felicidade retratados em polaróide.
Imagens nítidas de anos felizes e momentos bons. E como eram bons...
Uma coruja anunciou o meio da noite e ela começou a chorar.
A saudade era uma sensação de eterna dor. Uma tortura sem fim que não tem cura. Não para e não diminui com os anos.

O relógio bateu três da manhã, depois quatro, quatro e meia.
Suas lembranças iam soltas pelo tempo, como se ele realmente não existisse...