quarta-feira, 28 de julho de 2010

Então o amor é isso



Vi meus pais com olhos de filha a vida inteira.
Desde que me casei, passei a olhá-los com admiração ainda maior e a observar detalhes que antes eu não via.
Pelo casal que são, pela cumplicidade que têm, pelo carinho e compromisso que assumiram ao longo desta história que hoje completa 42 anos.
Um mundo só deles.
Lembro-me criança de ouvi-los conversando à noite no quarto. Creio que os problemas eram tratados sempre longe de nós. Nunca as atrocidades e os agravamentos em questões de orçamento, divergências ou outros assuntos eram discutidos em nossa presença.
Nosso contato um pouco maior era com a mamãe. Ela trabalhava dando aulas, por vezes em mais de uma escola, mas estava em casa aos finais de tarde para o checklist de mãe.
Quase não víamos meu pai. Ele saia para o trabalho muito cedo e voltava bem tarde.
Conseguíamos esperá-lo chegar quando ficamos mais velhas e a quantidade de sono era menor.
Uma lição de vida. As superações, as conquistas. Tudo que os permeia é notável.
Filha orgulhosa tenha certeza.
Amo vocês.
O casamento deles foi a primeira cerimônia na Capela Santíssimo Sacramento em Botucatu.
O vestido de minha mãe foi o mais lindo que já vi. Queria ter me casado com ele, mas não foi possível. O véu era enorme e cobriu toda a nave da capela.
É uma história que você acredita que não daria certo, jamais.
Minha mãe foi noviça por anos e meu pai estava noivo, mas já em vias de rompimento.
Conheceram-se no trabalho vindo de mundos distintos.
Minha mãe foi a primeira mulher a assumir o caixa de uma agência do Banco Itaú e meu pai era chefe de Inspetoria (não me pergunte o que quer dizer).
Conheceram-se, apaixonaram-se, casam-se e eis-me aqui escrevendo as memórias deles.
Seria mais justo que eles o fizessem.
Eles são luz. São exemplo a ser seguido de conduta e dignidade. De amor e cumplicidade.
Descobri o amor através dos olhos deles. A vida, por meio deles.
Amo. Mais que tudo e grata sou por eles. Por tudo.
Parabéns meus amores.
O presente levo amanhã.
Saudades. Sempre.






~ O Amor ~
~ Gibran Kahlil Gibran ~
Então, Almitra disse: “Fala-nos do amor.”
E ele ergueu a fronte e olhou para a multidão,
e um silêncio caiu sobre todos, e com uma voz forte, disse:
Quando o amor vos chamar, segui-o,
Embora seus caminhos sejam agrestes e escarpados;
E quando ele vos envolver com suas asas, cedei-lhe,
Embora a espada oculta na sua plumagem possa ferir-vos;
E quando ele vos falar, acreditai nele,
Embora sua voz possa despedaçar vossos sonhos
Como o vento devasta o jardim.
Pois, da mesma forma que o amor vos coroa,
Assim ele vos crucifica.
E da mesma forma que contribui para vosso crescimento,
Trabalha para vossa queda.
E da mesma forma que alcança vossa altura
E acaricia vossos ramos mais tenros que se embalam ao sol,
Assim também desce até vossas raízes
E as sacode no seu apego à terra.
Como feixes de trigo, ele vos aperta junto ao seu coração.
Ele vos debulha para expor vossa nudez.
Ele vos peneira para libertar-vos das palhas.
Ele vos mói até a extrema brancura.
Ele vos amassa até que vos torneis maleáveis.
Então, ele vos leva ao fogo sagrado e vos transforma
No pão místico do banquete divino.
Todas essas coisas, o amor operará em vós
Para que conheçais os segredos de vossos corações
E, com esse conhecimento,
Vos convertais no pão místico do banquete divino.
Todavia, se no vosso temor,
Procurardes somente a paz do amor e o gozo do amor,
Então seria melhor para vós que cobrísseis vossa nudez
E abandonásseis a eira do amor,
Para entrar num mundo sem estações,
Onde rireis, mas não todos os vossos risos,
E chorareis, mas não todas as vossas lágrimas.
O amor nada dá senão de si próprio
E nada recebe senão de si próprio.
O amor não possui, nem se deixa possuir.
Porque o amor basta-se a si mesmo.
Quando um de vós ama, que não diga:
“Deus está no meu coração”,
Mas que diga antes:
"Eu estou no coração de Deus”.
E não imagineis que possais dirigir o curso do amor,
Pois o amor, se vos achar dignos,
Determinará ele próprio o vosso curso.
O amor não tem outro desejo
Senão o de atingir a sua plenitude.
Se, contudo, amardes e precisardes ter desejos,
Sejam estes os vossos desejos:
De vos diluirdes no amor e serdes como um riacho
Que canta sua melodia para a noite;
De conhecerdes a dor de sentir ternura demasiada;
De ficardes feridos por vossa própria compreensão do amor
E de sangrardes de boa vontade e com alegria;
De acordardes na aurora com o coração alado
E agradecerdes por um novo dia de amor;
De descansardes ao meio-dia
E meditardes sobre o êxtase do amor;
De voltardes para casa à noite com gratidão;
E de adormecerdes com uma prece no coração para o bem-amado,
E nos lábios uma canção de bem-aventurança.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Inverno



Sei que devo esperar o inverno acabar e renovar todo o ciclo para que então haja um reinicio.
As horas parecem congeladas enquanto o vento sopra forte e me empurra para dentro de mim.
Estou sentada no alto da colina, observando os verdes campos da Escócia, pensando em quão sozinha estou. Meu espírito, livre, vaga pelo mar e volta para casa.
Meu corpo cansado e já envelhecido espera o momento de poder fazer o mesmo.
Tantas vezes quis voltar, mas não acho mais o caminho. Ele se perdeu de vez. Jamais saiu de mim, mas não consigo mais ver por entre as brumas.
Devo esperar que a estação acabe.
Sinto tanta saudade. Não vejo mais os meus. Ele desapareceu há anos, embora saiba que sempre está por perto, ele não vem mais em meus sonhos.
Naylah não voa mais. Não ouço seu pio. Não vejo mais seus olhos na noite fria, e isso me desorienta.
Apesar do sol forte, a visão turva como se fosse tempestade. As lágrimas se confundem com a chuva.
É tempo de esperar. Enquanto espero, planto o que quero que desperte quando a primavera chegar.
Vejo as cores que se mostrarão imponentes aos meus olhos marejados. Os ventos que semearão meus sonhos e que trarão vida de volta a este lugar. Desenho os símbolos sagrados em solo fértil e consigo ter paz, mesmo por um breve período, enquanto espero.
O sabor das maçãs, o aroma das flores, as tardes preguiçosas sobre a relva, o sol forte no rosto, mostrando que ainda estou aqui, viva.
Então, assim que o sol apontar a primeira manhã da estação das flores saberei que nova roda começará a girar. Terei minhas esperanças renovadas, os sonhos plantados e a aventura recomeça, mas enquanto isso...Inverno.