terça-feira, 27 de janeiro de 2009

O Cuco

Era uma vez uma menina curiosa que visitava o avô no interior de São Paulo.
A casa do avô era uma alegria. Primos, seus cachorrinhos, almoços em família, bagunça, liberdade de brincar na rua até tarde sem preocupações do mundo moderno.
A menina gostava, sobretudo de admirar o cuco que o avô mantinha na sala como parte de uma pequena coleção destes modelos de relógio espalhados pela casa.
Ele era lindo. Sua madeira escura imprimem dois pássaros em suas laterais. Seu pêndulo é uma espécie de ninho e os pesos de sua corda manual são duas pinhas.
A menina cresceu vendo aquele objeto e deliciando-se com as horas cheias e meias horas que ele registrava.
O tempo de uma infância na casa do avô.
Seu fascínio era tanto que cresceu imaginando se um dia poderia tê-lo ou pedi-lo para si.
O tempo passou, a menina cresceu, mas jamais se esqueceu do cuco que tantas alegrias registrou.
A casa do avô não existe mais e, embora tenham mudado, a menina, já mulher, encheu-se de coragem e pediu o relógio. Não o mesmo, talvez um menor ou mais simples.
O avô simplesmente sorriu. Seu sorriso era único e, assim como seu pai, o silêncio ou poucas palavras deveriam servir de consolo e justificativa para quaisquer indagações.
Então, em uma primavera, outono ou inverno de um ano qualquer, o cuco chegou em suas mãos. Presente do avô.
Veio todo embrulhado em jornal e desmontado para resistir ao transporte.
Não era nenhum outro cuco senão aquele que ela mais amava. O cuco da infância. Aquele que embalava sua imaginação e a fascinava soberanamente desde menina.
Ela acreditou que o melhor lugar para que ele ficasse fosse na sala, na mesma sala, de seus pais e onde aquele cuco poderia povoar os sonhos e a imaginação de seus filhos e sobrinhos.
Em uma véspera de natal, apesar de já muito distante, seu avô estava presente, em espírito.
Seu pai, dava cordas no cuco, enquanto um garoto, fascinado, em pé sobre uma cadeira, tentava decifrar seu engenho.
O menino cresceu, acompanhando o mesmo cuco, em uma terceira geração de admiradores do objeto.
Há 5 dias, o menino com quatro anos, perguntou para o avô como o cuco batia.
O avô colocou o menino sobre os joelhos e carinhosamente explicou. Assim como o avô da menina um dia com ela o fez.
O menino não queria dormir e o avô disse: “vá deitar. daqui há pouco o cuco vai bater 11 vezes, dez mais um e de sua cama você vai ouvir”.
A menina, vendo a cena, chorou. Pelos anos e tempo que o cuco já bateu e presenciou.
Pelas infâncias e alegrias que ele registrou.
Pelo avô, por seu pai, e pelo menino, seu filho.
Saudades vovô.
Sua neta, Claudia.

Um comentário:

Anônimo disse...

Simplesmente emocionante. Valeu!
Adoro você. Beijos mil.