quarta-feira, 13 de maio de 2009

Hoje acordei Fernando...



"Escrevo, triste, no quarto quieto, sozinho como sempre
tenho sido, sozinho como sempre serei. E penso se, a minha
voz, aparentemente tão pouca coisa, não encarna a substância
de milhares de vozes, a fome de dizerem-se de milhares
de vidas, a paciência de milhões de almas submissas como a
minha no destino quotidiano ao sonho inútil, à esperança sem vestígios. Nestes momentos meu coração pulsa mais
alto por minha consciência dele. Vivo mais porque vivo
maior. Sinto na minha pessoa uma força religiosa, uma espécie de oração, uma semelhança de clamor. Mas a reação contra
mim desce-me da inteligência... Vejo-me no quarto andar
alto da Rua dos Douradores, sinto-me com sono; olho,
sobre o papel meio escrito, a vida vã sem beleza e o cigarro
barato [...] sobre o mata-borrão velho. Aqui eu, neste quarto
andar, a interpelar a vida! a dizer o que as almas sentem!
afazer prosa [...]"...
Fernando Pessoa

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